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Da Toscana à Lombardia

Volta Pela Europa em 126 dias - Parte III
(Melhor bem acompanhada do que só...)

Fazia um mês e meio que eu estava na Europa para a minha primeira e sonhada viagem pelo mundo. Sem saber direito como fazer isso sozinha, eu vinha dando um jeito de continuar em boa companhia. Passei alguns dias com minha filha, em Londres; uma semana na casa de amigos em Paris; fiz um giro pelo Reino Unido com minha amiga Lais e, enfim, juntei-me a um grupo de amigos de Florianópolis que fazia turismo pela Itália.
                                                   fotos by: Ingri Boll
Edel, Abelardo, Susy e eu
Partimos de Roma num carro alugado em direção à Toscana, tendo pelo caminho aquelas paisagens já vistas em filmes e revistas. Divertimo-nos quando a Susy parou e quis descer pensando ter encontrado um belvedere para admirar o panorama. Era apenas uma pequena colina, igual a dezenas de outras e perdida em meio a uma plantação de oliveiras.
Susy e Abelardo
treinando para frentistas
Passamos por muitos pedágios. No início, tínhamos dificuldade de identificar a tempo em qual fila deveríamos entrar e achamos diferente abastecer pelo método self-service nos postos automatizados. 
Pelo menos em uma das vezes a máquina “engoliu” € 50,00 e travou.  Num domingo. Por sorte, a atendente de uma cafeteria nas proximidades aceitou ficar com nosso ticket para se ressarcir no posto no dia seguinte. Ufa! Recuperamos nossos preciosos euros.
Primeira parada: San Gimigniano, cidade em estilo medieval que me pareceu uma miniatura de ruas em labirinto. Um espiral de brinquedo: uma pequena praça, um poço, um castelo rodeado por ruelas e casinhas, tudo circundado por uma muralha imensa. Depois, vi que este modelo de cidade é bem comum em vários países da Europa. Mas, San Gimigniano foi a primeira e ficou com o privilégio da lembrança inesquecível.                                                                  
                                                    fotos by: Susy Schaefer
Conhecemos também Pisa, Verona, Florença, Pádua. Em Pisa, fiz bastante fotos, para me vingar da viagem anterior, quando apenas pude passar pela cidade à meia-noite, sem chance de ver a torre famosa por causa de uma greve de trens que atrasou nossa saída de Veneza. Em Verona, outra cidade em estilo medieval, cheia de ruazinhas por onde nos perdemos (mesmo com um mapa), ficamos um tempão procurando a Casa de Julieta.
Ao chegarmos a Florença, meus amigos se instalaram em um agradável Bed & Breakfast estilo familiar (os proprietários residem ali e gerenciam o hotel, que funciona no piso superior). Mas, não havia mais vaga quando tentei reserva pela internet quase em cima da hora. O albergue em que consegui ficava muito distante, ao contrário do que informava o site e a infra-estrutura se mostrou muito abaixo da minha expectativa.
Decepcionada, pedi cancelamento, mas tive que pagar pelos pernoites e ganhei só um descontinho mixuruca depois de muito choro. Nova lição da Itália: “quem erra paga”, disse o rapaz, pois expliquei ter me equivocado ao fazer reservas sem conferir direito as informações no site. Ruim também para o Abelardo, que havia arrastado minha mala pelas ruas, foi difícil encontrar o endereço, tivemos que dar muitas voltas. Terminamos retornando ao hotel do grupo onde dividimos um quarto (cama extra) Susy, Edel e eu. Pena que ninguém conseguiu dormir por culpa de uma tosse que me acometeu por umas três noites.
Proximidades da Galeria degli Uffizi
Em Firenze, cumprimos roteiro tradicional de turistas. Visitamos a catedral, o duomo, caminhamos pelas ruas, consultamos os mapas mil vezes, conseguimos até pegar ônibus e circular pela cidade.
Timidamente, eu começava a usar o italiano que havia aprendido.
Não houve consenso (nem haveria tempo) para aguardar na fila e comprar tickets para  entrar no famoso museu. Ficou para uma próxima oportunidade. Fizemos um passeio ao alto de uma colina e desfrutamos uma privilegiada vista panorâmica da cidade. 
Edel e eu interessadíssimas nos doces da vitrine

Seguimos para Assis, onde visitamos a Basília de São Francisco e o mosteiro.

Em Pádua, a programação previa sair dali para passeios de ida e volta e Cortina D’Ampezzo e Peschiera, próximo ao Lago di Garda. Nesta última cidade, visitaríamos Marta, uma brasileira amiga da Ingri e que está morando na Itália.
No caminho de Cortina D'Ampezzo
Parada para fotos a caminho de Cortina D'Ampezzo. Edel queria muito ver a cadeia de montanhas Dolomitas. Quando chegamos, fazia o maior frio e começou a chover. Mal conseguimos dar umas voltinhas pela cidade, tivemos que voltar correndo para o carro. 
Até então, eu não tinha conseguido decidir por onde começar minha viagem sozinha. Em breve o grupo se dividiria, eles seguiriam para Veneza e Paris, depois retornavam ao Brasil. 
Chegava a hora da despedida, eu pretendia seguir para o sul da Itália. Mas precisava decidir logo pelo menos qual o destino seguinte para poder fazer as reservas de passagens e albergues. Não conseguia, estava "travada". Então, entra em cena o imponderável: Ingri conversou com sua amiga Marta para que me recebesse por uns dias dando-me o tempo que eu precisava. 
Foi em Peschiera, assim, que comecei a etapa a sério da minha viagem, minha primeira experiência em fazer turismo sozinha.                                                                        
         Peschiera, ponto decisivo

            Com Marta e o namorado passeamos por Peschiera e em outra cidadezinha ali perto, Sirmione, depois fomos todos jantar numa pizzaria. Meus amigos foram embora, retornaram a Pádua, e eu fiquei.  Serei sempre agradecida à Marta e às duas brasileiras que moram com ela, Mariana e sua filha Danielle, pelo gesto de me receberem em casa mesmo sem me conhecer.
A generosidade delas deu o toque de confiança e o empurrão que eu estava precisando. Talvez, se não fossem elas, meu começo tivesse sido outro e alterasse a rota inteira da minha viagem.
            Danielle me emprestou seu quarto (meiga adolescente, gente fina). Mas, na verdade, eu estava me sentindo bem perdida, um tanto assustada. Estranhando a cidade, minha nova condição de viajante solitária, tudo. Sentia-me desconfortável por estar na casa de pessoas que eu acabara de conhecer. E, sobretudo, não tinha um rumo definido e não sabia bem o que fazer dali para diante. Vontade de voltar correndo pra casa e esquecer de vez essa história de ficar viajando sozinha por aí.
            No dia seguinte, Marta revelou-se uma anfitriã pra lá de gentil. Levou-me ao centro, mostrou-me a padaria, o mercado, a estação de trem, ponto de ônibus. Deu-me uma cópia da chave e seguiu para seus afazeres. E eu, apavorada, ainda sem saber o que fazer ou decidir.
Marta, anfitriã e fada-madrinha
Logo que ela me deixou, voltei quase correndo - como um cachorrinho - pra não esquecer o percurso. No mapa que peguei no centro de informações turísticas não constava o nome da rua, fiquei com medo de esquecer por onde andamos, já que passei conversando, distraída. Senti a maior satisfação quando, refazendo o trajeto, consegui encontrar o endereço onde estava hospedada. Afe! Só então relaxei e retornei ao centro da cidade um  pouco mais tranquila.                                                                                   foto by: Marta Netto                                  
Peschiera del Garda
Caminhei muito, dei muitas voltas, começando neste dia minha verdadeira viagem by myself e minha rotina de andarilha. Peschiera é uma cidadezinha linda, me lembrou  Floripa, as margens do lago parecem a Beira Mar. 
Mas achei-a um tanto “turística” demais para meus planos. Só via lojas, hotéis, bares e restaurantes e eu vinha mantendo o orçamento apertado, pois teria ainda mais de dois meses de viagem pela frente.
Não queria abusar da hospitalidade por muitos dias. Também não queria me comprometer fazendo reserva em algum albergue local sem ter certeza se ficava ali ou não.  Na verdade, eu ainda não me via como "turista". Procurava um lugar com preço acessível onde eu pudesse permanecer tranquilamente por uns dias para descansar (estava viajando há mais de 30 dias), refletir e traçar meu rumo. 
Durante a longa caminhada, fui me dirigindo até a estação de trem e terminei comprando passagem para Milão, primeira cidade que escolhi conhecer. Amigos haviam dito que não era uma cidade bonita ou interessante e que eu não iria gostar, mas apostei na  escolha. Sem me dar conta naquela hora, estava afinal decidido o impasse: eu não ficaria por mais tempo em Peschiera.                                                         fotos by: Ira
Lago di Garda
 Marta havia comentado sobre um passeio de barco no Lago di Garda e, antes de partir, agendei esta programação. O passeio de um dia inteiro foi divino, experiência perfeita para uma turista iniciante. Era a primeira vez que eu viajava desacompanhada e pela primeira vez senti o sabor indefinível de estar num lugar estranho sem conhecer nada nem ninguém, ouvir línguas estranhas sem compreender as palavras (no barco, havia turistas de vários lugares), tudo observar e não poder trocar idéias. Sensação indescritível, mas boa.
Limone sul Garda
Era início da primavera, o sol refletia-se timidamente sobre os picos ainda nevados das Dolomitas. O barco percorria o lago em toda sua extensão com paradas nas diversas localidades do entorno. Era possível descer, pegar outro barco, seguir adiante. Desci em Limone, onde aquela cortina de montanhas me causou uma impressão de beleza indescritível, quase uma sensação mística. Tivesse ali nascido e seria inteiramente outra minha concepção de vida. 
Ter decidido seguir em frente foi minha primeira conquista. 
Fui acrescentando outras a partir de então. Mais me valeu o fato de ter estado sozinha durante algum tempo do que propriamente os lugares por onde andei. Durante os quatro meses que durou toda a minha viagem estive em quatro países e percorri 40 cidades. Das 20 regiões em que se divide a Itália, conheci dez. As restantes, ficam para as próximas aventuras.
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